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quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Lygia Fagundes Telles, uma menina com 85 anos

Com o riso aberto de quem vê o mundo com humor, a escritora paulistana Lygia Fagundes Telles vive dias agitados aos 85 anos: assiste a Ciranda de Pedra, atual novela das 18h da TV Globo inspirada em seu livro homônimo, terá sua obra-prima "As Meninas" adaptada para o teatro e prepara-se para escrever um novo romance.

Lygia Fagundes Telles não seguiu o conselho dado pela amiga Clarice Lispector para não sorrir em fotografias, “porque uma escritora sorridente não é levada a sério”. Sem menosprezar a dica de Clarice, principalmente em função do avanço feminino em diversas áreas que começava a se esboçar, Lygia desobedeceu a orientação. E esbanjando sorrisos ou em poucas fotos austeras, a escritora, com 85 anos, colhe, em vida, os aplausos normalmente concedidos aos famosos após a morte.
A atual novela das 18h, “Ciranda de Pedra”, exibida pela Rede Globo, é baseada em seu livro homônimo. No SESC Consolação, um monólogo dramático extraído do conto “A Confissão de Leontina” está em cartaz, e uma adaptação de sua obra-prima, o romance “As Meninas”, começa a ser produzida para o teatro. Para completar, foi relançado o roteiro cinematográfico Capitu, redigido em parceria com o seu segundo marido, Paulo Emílio Sales Gomes.
Dona de uma escrita límpida, amplo vocabulário e uma sutil modulação de frases, Lygia alcança sua grande conquista literária no estilo. Com naturalidade, seu texto pode ser coloquial ou mergulhar fundo para compor uma frase que lembre o século XIX ou uma locução mais poética.
Nos contos, caminha, na maior parte, para a descrição fantástica, enquanto os romances tendem para o realismo. No livro “As Meninas”, de 1973, o realismo chegou a chocar setores da sociedade, ao tratar de tortura e outras deturpações vividas por três moças no período da ditadura militar. Expôs nas personagens Lia, Lorena e Ana Clara um misto de inadequação e rejeição. O livro tornou-se um dos grandes títulos da ficção brasileira do século XX.
Com trânsito livre nas rodas sociais e de estudantes na capital paulista nos anos 40, Lygia era uma ativista cultural na Faculdade de Direito e organizava saraus com autores famosos no grêmio estudantil. Levou a São Paulo, na época, nomes como Cecília Meireles e Erico Verissimo. É uma imortal na Academia Brasileira de Letras e integrante da Academia Paulista de Letras.
Sobre a morte, que já ceifou alguns membros familiares de intensa ligação, como o seu filho, aos 52 anos, ou seu segundo marido, Lygia diz que teve que lidar com a perda de pessoas próximas. "Há uma soma de seres que eu amei e que já se foram, mas, de um certo modo, eles ficaram um pouco em mim", afirma. "É difícil explicar com clareza, mas eu chamaria, assim, uma espécie de legado. E o fato é que me impregnei desse legado lá no indefinível que nos habita, a alma."

Principais obras
Ciranda de Pedra
- Lançado em 1954, o romance representa um marco na obra de Lygia, que o considera o seu primeiro livro maduro. É a história de Virgínia, caçula de uma família que se desfaz com a separação dos pais e, depois, a morte da mãe. Investigação psicológica do sentimento de rejeição, a obra originou duas telenovelas – uma delas em exibição atualmente.
As Meninas - História de três garotas que vivem em um pensionato de freiras enquanto cursam a universidade nos anos da ditadura militar. Na obra, Lygia demonstra todo o seu artesanato narrativo ao alternar os pontos de vista das jovens.

Seminário dos Ratos - Com 14 contos, a coletânea de 1977 traz elementos fantásticos, aproximando-se do realismo mágico. As Formigas, por exemplo, narra a história de duas jovens que encontram um caixote de ossos na pensão onde vivem.

A Disciplina do Amor - Publicado em 1980, este é talvez um dos livros mais pessoais de Lygia. Fragmentário, traz trechos de diários, crônicas, histórias curtas, anotações sobre escritores que a autora admira – do padre Vieira a Simone de Beauvoir.

Durante aquele estranho chá
- Primeiro livro de Lygia composto
somente de textos de não-ficção, esta coletânea traz matéria variada: memórias, crônicas de viagem (com destaque para o Irã), retratos de amigos e escritores como Jorge Amado, Clarice Lispector e Mário de Andrade.
Capitu - Escrito a quatro mãos com o marido, Paulo Emílio Sales Gomes, Capitu é um inteligente roteiro para uma adaptação cinematográfica de Dom Casmurro, que seria filmada em 1967 por Paulo César Saraceni. O roteiro ganhou nova edição em livro em agosto.
(*) fragmentos com base em matéria publicada na Veja São Paulo, do dia 6/agosto, assinada por Mario Rodrigues
postada por Márcia Fernanda Peçanha Martins

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